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CRÔNICA: Difícil despedida - por Cida Boss

11 de Nov de 2010 - 15h50min

Difícil despedida
Oh! Bendito o que semeia/ Livros... livros à mão-cheia.../ E manda o povo pensar!/O livro caindo n`alma/ É gérmen - que faz a palma,/ É chuva - que faz o mar. (Castro Alves)Andam alardeando as cassandras do apocalipse que o livro de papel está moribundo. Uma pesquisa divulgada pelo jornal “O estado de S. Paulo” revela que muitas crianças gostariam de ler suas obras preferidas digitalizadas. 25% das crianças ouvidas já leram um livro em parelho digital. Entre 9 e 17 anos, 57% estariam interessadas em fazer o mesmo.
A nova versão do livro é o e.book, sem papel, sem cheiro de tinta, sem virar de páginas, sem cantos dobrados para marcar o trecho já lido. As arautas de más novas assustam gente da minha idade. Imagino que as novas gerações não prantearão o desaparecimento desse objeto quase sagrado para a minha.
O escritor argentino Jorge Luis Borges declarou, certa vez, emocionado: “o maior acontecimento de minha vida foi, sem sombra de dúvida, a biblioteca de meu pai". No conto “Felicidade Clandestina”, Clarice Lispector narra, de forma primorosa, o sofrimento de uma menina pobre cujo sonho era ler “Reinações de Narizinho”. No final da narrativa, após ter conseguido seu tão desejado exemplar, a menina permanece abraçada ao livro, em êxtase, sem abri-lo por um bom tempo, tão grande eram o respeito e admiração pelo tesouro recém-adquirido.
Faço parte de uma geração que sabia que o livro era um tesouro de informações, emoções, devaneios. E me sinto temerosa de perdê-lo do jeito que o conheci e não o reconhecer, no formato diferente. Roger Chartier, em “A aventura do livro: do leitor ao navegador” enfoca a reorganização do mundo da escrita após o advento da Internet e as mudanças na forma de sua apresentação: do texto manuscrito em rolo de pergaminho para o códice, formato semelhante ao livro moderno impresso; do códice ao livro impresso; do livro impresso ao eletrônico. A cada mudança, imagino, o mesmo sentimento de perda deve ter se instalado no coração de quem ama ler.
Reconheço que não me atraía muito a idéia de ler no computador, com a cansativa luminosidade do monitor, vendo as páginas correrem de cima para baixo, como num pergaminho antigo. A tecnologia hoje já colocou as páginas eletrônicas uma ao lado da outra; a passagem é feita com movimentos que imitam a busca dos dedos pela quina da página.
Estou certa de que me adaptarei e terei o mesmo enlevo ao ler palavras cuidadosamente escolhidas e organizadas, na tela do meu computador. Afinal, quando se ama uma pessoa, ama-se o que ela é e não sua aparência. Da mesma forma, deixarei de lamentar a ausência física do papel, o cheiro e o tatear pelas páginas e me emocionarei com o conteúdo.
Mas... pelo sim, pelo não, manterei como relíquias amadas meus livros de papel, para os dias em que a saudade deles se tornar insuportável.

Cida Bosschaerts cidaboss1@hotmail.com



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